Um texto que complementa o relato bíblico da vida e do ministério de
Jesus, permitindo o acesso a conversas que ele teria mantido com o apóstolo
Tiago, supostamente seu irmão, pode ser a maior descoberta arqueológico de
caráter religioso dos últimos tempos. “Não suspeitávamos que os fragmentos
gregos do ‘Primeiro Apocalipse de Tiago’ tivessem sobrevivido”, afirmou
Geoffrey Smith, um dos pesquisadores responsáveis pelo achado. “Mas lá estavam
eles, bem na nossa frente”, disse Smith, que é professor assistente de estudos
religiosos na Universidade do Texas, em Austin (EUA). Ele fez a descoberta no
início do ano, junto com o colega Brent Landau, e ambos mantiveram sigilo até a
Reunião Anual da Sociedade de Literatura Bíblica, em Boston, também nos Estados
Unidos, em novembro. “Esta nova descoberta é significativa por demonstrar que
os cristãos ainda estavam lendo e estudando escritos extra-canônicos muito
tempo depois de os líderes cristãos os considerarem heréticos”, disse Smith ao
anunciar a descoberta. O termo extra-canônico se refere aos textos gnósticos
que ficaram de fora do cânone estabelecido pelo bispo Atanásio de Alexandria no
ano 367 a.C., após o Concílio de Niceia, quando foram definidos os 27 livros
aceitos como pertencentes ao Novo Testamento. O banimentos dos textos gnósticos
apócrifos, cuja autoria é atribuída aos cristãos primitivos, se deveu ao modo
como eles retratam Jesus: muito mais um mestre espiritual com a missão de
espalhar conhecimento sobre o homem e o universo do que como Messias, o filho
de Deus.
Geoffrey
Smith (esq.) e Bret Landau
“Primeiro Apocalipse de Tiago” texto grego estava em meio a 200 mil papiros de Oxirrico
O material foi encontrado depois de dois anos de pesquisas junto aos
mais de 200 mil documentos acumulados na Universidade de Oxford, na Inglaterra,
desde as pioneiras escavações dos papirólogos Bernard Pyne Grenfell e Arthur
Surridge Hunt feitas em um antigo depósito de lixo en z, no Egito, a partir de
1896. Boa parte do que foi encontrado ali é formada por recibos de impostos,
contratos de compra e venda e outros registros da vida cotidiana, mas há também
textos literários e religiosos. Até então, os poucos escritos gnósticos que
haviam sido preservados eram os da Biblioteca de Nag Hammadi, nome dado à
coleção descoberta em 1945 na cidade egípcia de mesmo nome pelo camponês
Mohammed Ali Samman. Eles estavam guardados dentro de potes de barro que foram
selados e enterrados, possivelmente por monges dedicados a preservar os livros
proibidos pela Igreja Católia. A técnica de preservação deu certo e os papiros
ficaram protegidos por mais de 1.600 anos.
“Ensinamentos
secretos”
O mais interessante do documento encontrado entre os papiros de Oxford,
claro, é seu conteúdo, com “ensinamentos secretos” que Jesus teria transmitido
diretamente para o apóstolo Tiago, possivelmente seu irmão. Eles incluem
revelações sobre o reino celestial, afirmam que o mundo material é uma prisão
criada por um ser maligno e que o caminho dos humanos a vida após a morte era bloqueado
por “archons”, entidades semelhantes aos anjos e demônios do Antigo Testamento.
Referindo-se a Tiago como “irmão” (embora “não materialmente”), Cristo teria
preparado o apóstolo para difundir seu conhecimento,
A maior parte dos textos gnósticos foram escritos em copta, a língua usada no Egito principalmente entre os séculos 3 e 6, mas os fragmentos encontrados por Smith e Landau estão em grego. Uma hipótese levantada pelos pesquisadores é que se trate de uma espécie de material didático, utilizado para auxiliar jovens egípcios no aprendizado do idioma. Duas características reforçam a crença: a caligrafia, bastante uniforme; e a separação das palavras em sílabas com uso de traços, um recurso que aparece “frequentemente em manuscritos usados em contextos educacionais”, segundo o pesquisador Brent Landau. Seja qual for a explicação para o texto ter sido escrito em grego, trata-se da primeira cópia conhecida do “Primeiro Apocalipse de Tiago” na língua de Homero.
O
ossário de Tiago
Assim que o engenheiro Oded Golan (foto abaixo), um judeu aficionado por
relíquias, revelou a existência de uma arca com os restos mortais do apóstolo
Tiago — e uma evidência de que ele seria irmão de Jesus — a Autoridade de
Antiguidades de Israel (AAI) tentou desqualificar o objeto. Primeiro, os
peritos alegaram que a inscrição em aramaico “Tiago, filho de José, irmão de
Jesus” seria forjada. Depois, tentaram provar que apenas o trecho “irmão de
Jesus” era falso. Passaram-se mais de cinco anos até que Golan fosse absolvido
da acusação de falsificar o ossário de Tiago. No processo de 12 mil páginas
foram ouvidas 133 testemunhas, entre elas, peritos em datação com carbono-14,
arqueologia, história bíblica, paleografia, geologia, biologia e microscopia.
Até que Yuval Gorea, um especialista em análise de materiais da IAA, admitiu
que os testes microscópicos confirmaram que tanto a primeira quanto a segunda
parte da inscrição têm a mesma idade do caixão: 2 mil anos. Com a absolvição de
Golan, o osssario foi também reabilitado. Ele é considerado a maior evidência
do parentesco entre Tiago e Jesus Cristo, o que a Igreja ainda não admite.
Revista Isto É
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